Divagação II

Cessa a musa antiga...

É provável que cesse a atual também, que já não sabe se canta ou regurgita o whisky de ontem nessa resenha infernal de ressaca brava...

De verso em verso o poeta se embriaga dessa água torpe da sarjeta que lhe banha o corpo sem lhe tocar a alma.

Pobre coitado em que me espelho... Pobre, desgraçado, coalho, apaixonado, épico, lírico, dramático,  amante, boêmio,  devasso, drogado, tísico, necrófilo, otário!

Doido...

Porque verso como quem chora de desalento e de desencanto...

Protótipo de poeta fracassado esse meu patético lamento. Intimista confessa, única virtude e talento. Lendo os amigos de outrora,  traduções de meus júbilos e tormentos, início às derrotas desse meu pensamento sem forma

Mundo,  mundo vasto mundo...

A rima em Raimundos, já dizia Drummond,  é rima e não solução. Porém alternativa quando tudo que resta é uma fuga sem destino ou direção.

Infinito enquanto dure? Só esse momento pêndulo de melancolia... É que um sonho me pôs acordada e eu vi então, não dormia... meu tino desesperado de utopias na verdade não é mais que uma cama vazia... Caso contrário,  não é amigos, ia fazer lira

E o amargo dessas palavras já é, em se pensar poema, ironia.
eu declaro esta infâmia e sem agonia... Agora deixar de escrever? Seria morrer sem existir como as lágrimas que retenho

E se há motivo do pranto?  Eu já não lembro... a dor já não é uma inimiga
Somos companheiras antigas que se cumprimentam de olhar esquecido
E jogamos cartas madrugada a dentro
Como boas e velhas conhecidas, eu não a subestimo, ela não se antecipa

Tudo porque de um humano coração com mais verdade amou como amigo e mais como amante em tão diversa realidade...

No furacão das paixões vividas e das mágoas a mim ofertadas, eu desejei a dádiva de um amor tranquilo, mas ao vislumbra-lo, tão sólido, pleno e calmo; perguntei se era possível. O encanto se desfez como em magia e naquele instante  não mais o tinha,  pois, ao contrário das incandescente paixões que lhe tomam sem consentimento e te consomem sem permissão; esse outro precisa de grande alimento e crença em sua existente razão... e um humano magoado é desacreditado por defeito imputado

De sonhos presentes que um dia sonhei
Hei de chorar de repente por ver despertado que havia sonhado...

Amigos poetas eu os admiro. Vós tens dom, clareza e brilho, desse meu jeito torto em desabafo homenageio e agradeço pelas traduções de júbilos e desesperos...

Cessa essa musa rota que de tão embriagada só balbucia. Pobre desgraçada só cantando se alivia...

E você que, por algum motivo, a atenção há lhe dispensar pode rir com força e tom ingrato.  Tentando bancar a poeta me fiz tola recrutando cacoete e riso. Mas eu logro, com altivez, o dolo.
Se o verso não cura, que no mínimo o humor me sirva de consolo

Jessica Leite













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