Postagens

Mostrando postagens de janeiro, 2014

V

Aos amantes é lícito a voz desvanecida. Quando acordares, um só murmúrio sobre o teu ouvido: Ama-me. Alguém dentro de mim dirá: não é tempo, senhora, Recolhe tuas papoulas, teus narcisos. Não vês Que sobre o muro dos mortos a garganta do mundo Ronda escurecida? Não é tempo, senhora. Ave, moinho e vento Num vórtice de sombra. Podes cantar de amor Quando tudo anoitece? Antes lamenta Essa teia de seda que a garganta tece. Ama-me. Desvaneço e suplico. Aos amantes é lícito Vertigens e pedidos. E é tão grande a minha fome Tão intenso meu canto, tão flamante meu preclaro tecido Que o mundo inteiro, amor, há de cantar comigo. - Hilda Hilst.

Pesamento no Relógio

Os minutos consomem dias e horas  mente que gira sem destino  tiquetaqueando vai o relógio  e aquela lembrança do dia ao sol esfumaça os segundos martelam os ouvidos sangra demoradamente , vertigens inglórias... E não fosse a demora de noite que tarda a chegar Ansiaria o sabor da aurora em clara melancolia  E a saudade impera sem entristecer  O corpo gela na agonia errante da espera  tique taque que consome uma vida inteira  Aquele dia de ontem, ou seria amanhã?, a  palavra que não te ouvi dizer... Foi o relógio que roubou o momento de falar foi o tempo que não deixou, fechou minha entrada tiquetaqueou minha vida, me deixou desapontada (o devaneio da espera  é uma quimera desvairada tudo que nela impera é deveras desmensurado) O tique taque do relógio consome vidas sem parar A perca da rotina é sempre o melhor perder tudo e se encontrar, navegar a céu aberto sem nunca veleja errante ideia que viaja sem parar minut...

Mais uma de Amor... Talvez

Sou capaz de sentir o que o outro não admite. Corta a minha alma a tua saudade corriqueira Esse teu sorriso que camufla um olhar triste Me deixa ver claramente o vazio que te habita Me ferre esse mal que te ataca Eu sangro por essa ferida que não é minha  e sofro essa dor de fora do meu corpo  Se eu pudesse te dar a cura, mostrar-lhe a saída  Mas a tua felicidade é coisa que não me pertence. Errante e vazia tua alma solitária  mil leitos visita sem encontrar alento  E meus braços cada vez mais solícitos sentem pena O teu passado perdido  a sombra desta memória no presente tão buscado teu futuro é só desejo  é retorno negado. E me dói a tua dor por imagem espelhada  É essa tristeza nos teus olhos  que me põe desesperada Nem encanto, nem magia Esse fascínio que me instiga É um desejo de menina De, quem sabe um dia, Ver brincar nos teus olhos, de novo, a pura alegria. Por: Jessica Leite.

R.W.

Imagem

Ser

Figura lacrada, presa na moldura Sala escura, fechada Penumbra! visão se esguelha sem permissão Sabe que sente a visão que não reconhece Escuridão engole luz rejeitada Olhar congelado, além do imediato nada olha, o universo, toda amplidão vê Desgarrada imagem que se perde Reflexo inverso, espelho plano Escorre sangue sem corte Trespassado em brilho, ferido Macula de redenção e sorte. Morreu naquele instante uma vida Desfez-se em si para se conhecer Cravou no concreto tardia raiz Chegando em abandono propício a partida Clareando-lhe o sol do meio dia Em seu primeiro entardecer. Corpo violado por opção, Refaz-se fora de si para ser Expande, ascende, vaza. Exala odor de vida e se acaba Fulgor de estrela extinta Rasgando vácuo escuro Contrária a sina esperada por aceita-la Frio brilho de vida aquecendo olhar do mundo De volta a infância, universo em mãos. De olhos abertos pode então crescer Recolocada ao mundo, Renasceu Possibili...

Lembrança perdida

Composição malfadada, condenada de início Satisfaz essa existência esgarça Encontrando seu prodigioso fim e encanto. A morte desejada que cultiva como um vício, Esse corpo que te maltrata E que só você aflige. Ingrata! Some quão mais esforça a retenção Palavra vazia na fumaça opressora inalada Expirada em desvairo Rompe com pulmão e diafragma Rasga-lhe a garganta O eco rouco do silêncio. As duras penas da lembrança Já tão apagadas pelo tempo Desfazem a cadeia neural No violento ressurgimento Em mil eras calada brilha a constelação de pensamentos. Sol extinto volta a queimar Ao seu redor outro sistema, Nova ordenação. Começo de mais um fim Morte por opção. Retorno sem regresso Negro! Princípio primário do começo O caos, bem digo, digno Não vale gritar Esqueço!